Luke Cage 2ª Temporada | Crítica: Um novo nível de herói, um novo padrão para as séries da Netflix
Depois dos acontecimentos de Os Defensores, muito se perguntou sobre como seria o futuro dos heróis da Marvel na Netflix. Com o sucesso da segunda temporada de Jessica Jones, que preferiu seguir um rumo diferente aos eventos de Nova Iorque, agora foi a vez de Luke Cage (Mike Colter). O herói a prova de balas nos mostra nessa temporada que os eventos com seus parceiros improvisados lhe afetaram, principalmente na sua fama nas ruas do Harlem. Mas até que ponto isso foi positivo ou negativo na vida do herói?
Nos quesitos técnicos, que não foram problemas na primeira temporada, o segundo ano do show conseguiu evoluir ainda mais. O principal ponto forte de Luke Cage acaba sendo sua trilha sonora, que assim como no primeiro ano, retorna quebrando tudo. Se já havia sido bom ouvir o melhor do jazz, blues e hip hop no Harlem’s Paradise, agora temos a adição do reggae. Isso torna tudo ainda mais perfeito com a abordagem de cenários que os produtores fizeram com o núcleo jamaicano presente na série, passando uma maior credibilidade e assimilando ainda mais a cultura africana, desde sua raiz aos dias atuais. Porém se o visual dos cenários e trilha sonora foram muito bem, os efeitos especiais seguem em débito. Claro que é difícil adaptar um herói a prova de balas e fogo na TV, mas cabe um pouco mais de capricho. Muitas vezes devido a força desproporcional que Luke Cage possui, os arremessos e golpes em humanos comuns acabam ficando feios em tela, lembrando seriados de heróis com baixo orçamento na década passada. No mais, quem for assistir pode ficar tranquilo, pois a essência da série foi mantida e muitas coisas melhoradas. A identidade visual do seriado, com amarelo remetendo ao herói, segue presente, além é claro, do melhor retrato possível do Harlem.
Um dos principais problemas da primeira temporada de Luke Cage foi a falta de ritmo da série. Os treze episódios tornaram-se quase que uma maldição nas séries da Marvel Netflix. Muitas vezes, em até oito ou nove capítulos seria possível resolver toda trama. Muitos bons personagens não foram explorados, deixando o foco apenas no herói e em sub-tramas sem sentido. Mas dessa vez foi diferente e os treze episódios mostraram-se necessários e agradáveis de se assistir. De cara é possível observar que este elemento foi consertado com louvor para a atual temporada. Logo nos três primeiros episódios nos encontramos e relacionamos com personagens do primeiro ano do show e alguns que já fazem parte do universo expandido da Marvel com a Netflix. Porém isso se dá também para as novas adições do elenco. Personagens que aos poucos vão mostrando suas motivações e deixando ao espectador a decisão de se relacionar com eles, para o bem ou para o mal.
Dentre os remanescentes da primeira temporada, sem sombra de dúvidas o destaque fica para o trio: Misty Knight (Simone Missick), Mariah Dillard (Alfre Woodard) e Shades (Theo Rossi). A detetive que passou por um drama, físico e mental, retorna decidida a fazer o seu trabalho. Sua jornada é muito similar a do próprio Luke Cage (que falaremos em breve), oscilando entre seguir a lei e deixar os vilões livres, ou, usar de meios não oficiais para pôr um fim nas coisas. Um dilema muito interessante, que faz com que as pessoas criem uma maior empatia e abracem a policial como uma das favoritas na série. Quanto ao núcleo dos vilões remanescentes, finalmente tivemos a oportunidade de ver o verdadeiro potencial deles. Sem as presenças de Boca de Algodão (Mahershala Ali) e Kid Cascavel (Erik LaRay Harvey), que no fim das contas eram os principais vilões da primeira temporada, Mariah e Shades tiveram tempo de tela para poder brilhar. O fato de explorarem a fundo o passado dos dois, revelando a verdadeira motivação de ambos para o modelo de vida atual no crime, ajuda a entender um pouco a importância deles para a trama. Também pelo fato do Harlem não ser apenas um bairro, mas sim um dos personagens principais da série, fica evidenciado a razão de todos quererem ser o herói da região, mesmo que com ideias e atitudes que sequer chegam perto do heroísmo. Basicamente, todos amam o Harlem, mas não conseguem fazer com que o Harlem os ame.
Nomes como Claire Temple (Rosario Dawson), Foggy Nelson (Elden Henson), Colleen Wing (Jessica Henwick), Danny Rand/Punho de Ferro (Finn Jones), dentre outros também aparecem na série. Apesar de ser uma espécie de fã service, não são aparições aleatórias. Como em todas as demais séries do universo Marvel Netflix, esses personagens servem como uma conexão de um universo expandido, garantindo ao espectador que tudo faz parte de um único ideal, além de despertar a curiosidade de assistir as outras séries e descobrir mais sobre os mesmos. Uma dessas participações roubou a cena em Luke Cage: Danny Rand/Punho de Ferro. Todas as críticas pesadas em cima do personagem em sua série solo e em Os Defensores foram justas, principalmente porque destoava dos demais heróis da Netflix. Dessa vez foi diferente, aliás, parece algo novo. Mudanças desde a personalidade até ao físico do Punho de Ferro foram importantes, mas nada irá superar a dinâmica entre Danny Rand e Luke Cage. Em Os Defensores tivemos um gostinho do que isso poderia render, mas na segunda temporada do herói do Harlem, os fãs tiveram uma certeza do futuro da dupla. Um humor dinâmico, respeitando as características de cada um, mas sempre mostrando o que eles podem aprender trabalhando juntos. Claro que esta crítica não contém spoilers, porém se você é fã dos quadrinhos dos “Heróis de Aluguel”, fique atento, não seria surpresa se a Netflix e a Marvel em breve anunciar uma série dessa dupla.
Indo de encontro aos novos personagens do elenco, fica fácil resumir tudo através do vilão. O jamaicano Bushmaster (Mustafa Shakir) retorna a Nova Iorque em busca de vingança contra a família Stokes. Apesar de parecer algo clichê e piegas em filmes e séries de heróis, sua motivação vai muito além disso. Guardadas as devidas proporções, o papel de Bushmaster lembra muito o de Eric Killmonger em Pantera Negra. Calma, lembrar não significa ser igual. Porém é interessante notar como a Netflix soube pegar questões raciais que foram exploradas em um âmbito global em Pantera Negra e utilizar em um nível menor, no bairro do Harlem, como fez em Luke Cage. Questões importantes como imigração, apropriação cultura, escravidão e xenofobia foram abordadas nesta temporada. A situação política atual dos Estados Unidos acaba recebendo inclusive algumas críticas dentro do seriado, visto que por se passar nos dias atuais, além de ser em um grande centro populacional nova iorquino, Trump e seus “muros” não passariam despercebidos. Quanto a desenvolvimento e caracterização, Bushmaster nos mostrou o potencial que as séries da Marvel e Netflix terão daqui à frente. Por ser jamaicano, o ator soube trabalhar muito bem o sotaque no inglês; as roupas típicas de pessoas do país são bem adequadas; e o personagem exerce grande defesa cultural sobre o seu povo. Pode parecer óbvio e necessário, mas muitos pontos positivos à Netflix são seu empenho na hora de elevar coisas como capoeira, religiões africanas, danças típicas, dentre outros elementos da cultura jamaicana e de outros países africanos que ajudaram a contribuir para a formação atual deste país na América Central. Em suma, não se surpreenda se em determinados momentos você se relacionar com Bushmaster e questionar se os seus métodos estão certos ou errados. Indo mais além, você perceberá que suas motivações não são tão diferentes das de Luke Cage, apenas seus métodos de alcançar isso que são totalmente opostos.
Infelizmente, a temporada possui seus erros, pois existe entre os episódios uma mudança drástica de ritmo, variando entre momentos de ação e longas cenas de diálogos e reflexões. Mas isso acaba por não ser tão prejudicial, as cenas de diálogos tornam os personagens coadjuvantes uma ferramenta interessante para a trama, destaque para o reverendo James Lucas (Reg E. Cathey) e Sahr Ngaujah (Paul Anansi Maclntosh), que fazem o papel de sábios e mentores. Menção honrosa a Reg E. Cathey, que faleceu durante a pós-produção da segunda temporada. Outra personagem que se destaca e passa por um incrível arco dramático é Tilda Johnson (Gabrielle Dennis), a médica curandeira tem uma trama inteira para construir sua narrativa e dar a expectativa de seu papel num possível próximo ano.
Para finalizar, não podemos deixar de falar do astro principal. Luke Cage desde a sua primeira aparição mostra ser um cara que tem poderes e prefere utilizá-los sozinho. Esta temporada mostra que se Luke não perceber que sozinho ele não irá alcançar seus objetivos, pode haver consequências. Passados os acontecimentos de Os Defensores, o herói a prova de balas tem que lidar com sua vida pessoal e o seu fardo. Obviamente o excesso de peso em seus ombros afeta o personagem, fazendo com que fantasmas do passado venham à tona. O tom mais sério e sombrio leva à uma temporada onde os produtores transformaram totalmente o perfil de Luke Cage, fazendo com que ele tome atitudes mais drásticas. Literalmente fica exposto que quando o negócio é proteger o Harlem, ele não mede esforços, mesmo que isso afete seu caráter e o leve a parcerias jamais imaginadas pelos espectadores desde que o personagem nos foi apresentado.
Se você estava preocupado com o futuro de Luke Cage, e com o das outras séries da Marvel com a Netflix, fique tranquilo. Os erros cometidos em Os Defensores e Punho de Ferro foram corrigidos. A partir do lançamento da segunda temporada de Jessica Jones, é notório o novo tom que será adotado pelos seriados, além de tornar as séries mais coerentes. Com a segunda temporada de Luke Cage não é diferente, é uma série que soube se reformular, porém, também corrigiu os erros que levaram a crítica não aceitar tão bem seu primeiro ano. Agora chega de papo, é hora de maratonar a série e deixar sua opinião aqui para nós da Be Geeks. Sweet Christmas! Nota: 4/5
Revisado por: JV Vicente