Visão do Fã | Rocky Balboa
Se hoje Sylvester Stallone é um dos atores mais bem pagos de Hollywood, isso se deve ao seu sucesso estrondoso com seu personagem Rocky Balboa. Inspirada na luta do desconhecido Chuck Wepner que desafiou Muhammad Ali em 1975 (saiba mais), Rocky: Um Lutador é sobre um pugilista que recebe a incrível oportunidade de lutar contra o campeão mundial, Apollo Creed (Carl Weathers).
ROCKY: UM LUTADOR (1976)
O grande clássico vencedor de três Oscars é daqueles filmes que deve estar na lista obrigatória de qualquer pessoa. Com um orçamento mínimo, o diretor John G. Avildsen junto com o diretor de fotografia James Crabe mostram sua criatividade em diversos momentos importantes. A primeira cena do filme apenas nos apresenta o protagonista e sua profissão de boxeador.
Corta-se para Rocky caminhando nas ruas da Filadélfia, indicando desde já muitas características do personagem sem um único diálogo. A opção por trabalhar com um plano geral revela detalhes sobre o cenário e, sobretudo, Rocky. Uma delas é a sua condição financeira, pois ele não possui um carro e ainda mora num subúrbio. Outra característica é a vida solitária dele. O enfoque dado às ruas, com Rocky ao fundo, expressa seu sentimento de pequeneza diante do mundo a sua volta. Só depois de sete minutos de filme que vamos saber que ele mora sozinho numa casa minúscula e desarrumada.
Também não é coincidência que boa parte das cenas é enquadrada com a câmera baixa. Primeiramente devido à estatura do ator. Mas outra questão mais relevante é mostrar que Rocky é um sujeito que não se abala facilmente. A fotografia mais uma vez denota a autonomia do protagonista (se não herói).
Após conhecermos tudo sobre o dia a dia de Rocky numa questão de trinta minutos de filme aproximadamente, temos outra cena interessante. Voltando do bar para sua moradia, ele passa por uma roda de garotos fumando e falando besteiras e retira uma garota presente no meio, a qual aparenta ser a mais nova da turma. Ele toma o cigarro da boca dela e lhe dá uma bronca, explicando para ela o que é respeito, como é importante construir uma boa reputação e que não seria andando com os “rapazes legais” e fazendo tudo que eles ordenassem que ela conseguiria isso. Essa cena manifesta-se como nada muito importante para a trama, mas é muito mais do que parece. Agora que sabemos tudo sobre sua vida pessoal conseguimos nos projetar em Rocky e em suas dificuldades. Além disso, fica mais fácil compreender a atitude benevolente de ajudar uma adolescente desconhecida e perdida. É dessa cena que concluímos que ele não só é uma pessoa que se preocupa com as pessoas de sua vizinhança, mas um verdadeiro herói.
Desde então, chegamos ao segundo ato do filme, onde se desenvolve a história. Rocky começa a namorar Adrian (Talia Shire), Apollo desafia o Garanhão Italiano (como se proclama no ringue) para uma luta, e o herói tem que tomar rumo na vida se quer mesmo enfrentar o campeão mundial. E temos a cena clássica dele subindo a famosa escadaria ao som de “Gonna Fly Now”, do compositor Bill Conti.
O terceiro ato nos carrega para o tão esperado confronto entre Rocky e Apollo. A fotografia chama atenção novamente ao lado da excelente coreografia, que concede uma verossimilhança fortíssima. Os golpes parecem tão realistas e a maquiagem contribui com o rosto inchado e sangrando dos pugilistas. Para intensificar ainda mais o clímax, a trilha sonora chega a seu ponto máximo. Com um final de arrancar lágrimas, Rocky é um filme inspirador digno do título de clássico do cinema.
NOTA: 5 / 5
ROCKY II: A REVANCHE (1979)
Fazer a continuação de um filme de sucesso não é nada fácil. O primeiro segue a premissa da Jornada do Herói, em que um conflito obriga o protagonista sair da sua vida ordinária para um novo mundo de desafios. Rocky: Um Lutador termina um passo antes de completar o ciclo da Jornada. Durante o duelo supremo contra Apollo, o herói é derrotado por uma questão de pontuação, no entanto ganha proeminência do público e da mídia por ter sido o único a aguentar os quinze rounds de uma luta contra o campeão. É daí que Rocky II começa. Revemos o final da luta do primeiro filme, depois disso vai para o hospital, e assim que curado, volta para sua vida comum, finalizando o ciclo.
É um costume de Hollywood fazer sequências onde o antagonista deva ser maior e melhor que o do primeiro filme. A razão pela qual Rocky II está a altura do seu antecessor e consegue ser tão bem executado é exatamente essa despreocupação em procurar um outro adversário para o herói. O oponente é Apollo novamente, que se vê furioso com o que os jornais andam falando dele. Apesar de sua vitória no ringue, o fato de Balboa ter ficado de pé até o fim foi como uma derrota para Creed. Sua fúria fomentou sua determinação em chamar o personagem de Stallone de volta ao ringue e provar seu valor de que permanece sendo merecedor do título mundial. Mas Rocky rejeita inicialmente.
Enquanto isso, Rocky enfrenta novos desafios ainda mais complicados. Sua deficiência no olho direito provocada pela luta o obriga abandonar a vida de pugilista. Balboa tem que arranjar um novo emprego o mais rápido possível, agora casado com Adrian e com um filho a caminho. Entretanto, seu fracasso em outras profissões, junto com os problemas de saúde vividos por Adrian e o nascimento prematuro de seu filho, forçam Rocky retornar ao ringue contra Apollo.
A luta, contudo, é um pouco controversa. A coreografia é tão bem executada quanto à do filme anterior. Mas o uso da câmera lenta nos momentos finais torna óbvia a vitória de Rocky, além de que dramatiza demais a cena.
NOTA: 5 / 5
ROCKY III: O DESAFIO SUPREMO (1982)
O sucesso de dois filmes levou a criação da sua terceira parte, que veio ao Brasil com o subtítulo de “O Desafio Supremo”. E ao que o filme dá a entender realmente é o maior desafio a ser enfrentado pelo nosso herói desde o segundo combate contra Creed.
Balboa vem ganhando uma série de títulos e, consequentemente, mais fama. Agora rico, Rocky realizou todos seus sonhos: casou-se, teve seu filho e organiza eventos beneficentes. Como o atual campeão do mundo, não há obstáculos que ele não possa vencer. Ou pelo menos é o que ele acreditava até descobrir que seu treinador Mickey (Burgess Meredith) era o grande responsável pelas vitórias do protagonista, que arranjava oponentes propícios a perder para Rocky.
Quando um lutador em ascensão rápida, chamado Clubber Lang (Mr. T), desafia Rocky, ele não perde a chance de provar a si mesmo que merece continuar com o título mundial. Porém, em questão de minutos, o protagonista perde não só a luta, mas seu tão querido amigo e treinador, Mickey. Nesse momento, uma ajuda inesperada aparece se oferecendo para treiná-lo: Apollo Creed. Atualmente aposentado, Creed leva o Garanhão Italiano para a academia onde o antigo campeão começou.
A partir de Rocky III os filmes da franquia passam a ser mais ação e menos drama. Os personagens secundários não são tão explorados e normalmente funcionam apenas como um suporte para Rocky alcançar seu objetivo de vencer a luta. Todavia, há momentos poéticos como o diálogo entre Adrian e um Rocky acovardado, e outros bem dramáticos como a cena da morte de Mickey.
Diferentemente de Apollo, Clubber Lang é um antagonista unilateral: revoltado o tempo todo e ausente de motivações. Por que ele quer tanto derrotar Rocky? Pelo título mundial talvez? Em nenhum momento, a sua fúria intensa contra o campeão fica clara. Mesmo assim é um filme divertido, com cenas comoventes e memoráveis, e uma abertura fantástica ao som de “Eye of the Tiger”, da banda Survivor.
NOTA: 4 / 5
ROCKY IV (1985)
Esse com certeza é o filme mais amado pelos professores de História. Rocky IV é um show de idolatria da bandeira norte-americana, que deve confrontar a terrível ditadura soviética, o comunismo, o puro mau.
Um lutador que vem se destacando no Oriente, Ivan Drago (Dolph Lundgren), irrita Apollo Creed, que vê como uma afronta contra ele e Rocky. Por isso, Creed decide vestir as luvas mais uma vez para provar que... Para provar que os EUA ainda têm os melhores lutadores do mundo? Bem, talvez seja isso. Ao final, Drago mata Apollo na frente das câmeras do mundo inteiro.
Com o falecimento de seu grande amigo e mestre, Rocky busca vingança. Isso o leva para a União Soviética numa casa de madeira no meio do nada para treinar intensamente. Um embate épico acaba derrotando Drago e ferindo o orgulho da nação soviética. Para ficar ainda mais piegas, o filme ainda tem o atrevimento de terminar com um discurso tosco de Rocky que colocaria um fim à Guerra Fria.
Rocky IV é a pura expressão do preconceito do Ocidente contra o Oriente. A segunda metade do século XX foi marcada por um mundo bipolarizado, o antagonismo entre o capitalismo e o comunismo, que gerou atritos entre as nações e um crescimento exponencial de bombas nucleares, missões espaciais e armas de fogo. Por muitos anos, Hollywood produziu filmes com antagonistas russos, asiáticos ou comunistas. Rocky IV é certamente o mais ousado de todos e o melhor para compreender o que foi esse tempo.
O ponto forte do longa é a sua trilha sonora, que deixa de lado a composição memorável “Gonna Fly Now” do primeiro filme, e se permite entregar algo diferente e inovador para a franquia. Rocky IV traz Survivor, John Cafferty, Robert Tepper, entre muitos outros grandes sucessos da década de 1980.
NOTA: 3 / 5
ROCKY V (1990)
Um dos maiores erros já cometidos pelo cineasta ou crítico em formação é pensar que para entender bem de cinema temos que ver filmes bons. Isso é uma meia verdade. Porque mesmo que seja importante estudar e ter repertório com ótimos exemplos para argumentar e julgar a qualidade de um filme, mal sabem que ver filmes ruins é de uma importância imensa também. Isso porque quando ao assistir um filme cujas decisões do roteiro, da direção, da edição etc. foram mal feitas, acabamos aprendendo a partir do contra-exemplo. Se conhecer exemplos é bom, é ainda melhor saber o que não fazer ao produzir um filme. Este é o caso de Rocky V, certamente um dos piores longas já feitos na história do cinema.
O primeiro equívoco já inicia da premissa do filme, que foi realizado apenas por ganância, como o próprio Sylvester Stallone já admitiu. O enredo segue de um ponto sem noção e partindo daí só vai declinando progressivamente. Por alguma razão nunca explicada, Paulie (Burt Young), o cunhado do Rocky, fez um péssimo negócio e por culpa dele a família perdeu todo dinheiro. Agora eles retornam para o bairro onde tudo começou na Filadélfia. Depois disso, um drama intenso carrega o primeiro ato do filme, apresentando um Rocky obrigado a se aposentar após uma lesão cerebral sofrida durante a luta contra Drago. E essa informação é relevante para isso, pois nunca mais será lembrada dali para frente.
No desenvolvimento, surge o pior personagem de todos: Tommy Gunn (Tommy Morrison). Um garoto sem pais e sem casa que ama boxe e disposto a treinar duro para se tornar um lutador. Rocky se sensibiliza e decide treiná-lo. Gunn cresce na vida e fecha acordo com um empresário desonesto, George Washington Duke (Richard Gant). Em razão disso, o garoto demonstra seu lado agressivo e cretino ao abandonar Rocky.
Nosso herói, de coração partido agora, percebe como negligenciou seu filho, Robert Balboa Jr. (Sage Stallone), esse tempo todo, o qual começou a entrar num estado de rebeldia pré-adolescente acompanhado de novos amigos do colégio público que frequenta. Rocky vai tentar fazer as pazes com ele e num passo de mágica tudo se resolve de maneira simples, fácil e pouco convincente.
O desfecho acaba numa luta ridícula entre Rocky e Tommy cheio de fúria e ódio na rua. Esqueça os ringues, as normas do boxe e aquelas cenas de treinamento inspiradoras de todos os filmes da franquia. Agora tudo se resolve na rua, num cenário muito escuro, com cores excessivamente artificiais, numa cena pessimamente montada. A luta é inverossímil, os golpes trocados deixam na cara que não são reais. Os movimentos de câmera são muito rápidos e mal enquadrados, os cortes são velozes, deixando tudo muito confuso aos olhos do espectador.
Outro problema grotesco é a péssima direção de atores. Stallone está terrível e forçado, bem como Sage Stallone, Tommy Morrison e Richard Gant. Os personagens de Talia Shire e Burt Young são inteiramente esquecidos e na maior parte da trama não exercem nenhuma função relevante a não ser estar ali na cena.
Há momentos que se salvam como o flashback de Rocky tendo um diálogo com seu treinador Mickey, que é comovente e inspirador. Mesmo assim, não dá para acreditar que foi dirigida pelo mesmo que fez o primeiro longa da fraquia e que rendeu três Oscars. Rocky V é um erro de roteiro, de construção de narrativa, de direção, de fotografia, de montagem e de atuação.
NOTA: 1 / 5
ROCKY BALBOA (2007)
Tido como um grande tributo à saga, Rocky Balboa apresenta nosso herói velho. Agora ele dedica seu tempo ao seu restaurante italino Adrian’s, em homenagem à sua falecida esposa.
Sua vida muda depois de ficar amigo de uma moradora antiga dali do bairro. A sua vontade de voltar para o ringe cresce desde então para sentir um pouco da energia da sua juventude. A oportunidade lhe cai perfeita quando um programa de televisão aposta quem venceria numa luta entre ele e o atual campeão dos pesos pesados, Manson Dixon (Antonio Tarver). Uma emocionante aventura inicia com o duro treinamento para a luta.
Em Rocky Balboa, não é apenas nosso herói que está envelhecido. Trata-se de um filme amadurecido. É um filme carregado de lições a dar sobre a vida. A cena em que Rocky ensina seu filho a ter persistência para alcançar seus objetivos é talvez a melhor cena de todos os filmes. É um texto poético, cheio de metáforas, a interpretação de Stallone é excelente, um ótimo exemplo de monólogo para quem for estudante de cinema.
NOTA: 4 / 5
OUTRAS INDICAÇÕES
CREED: NASCIDO PARA LUTAR (2015)
O filme que dá sequência a saga é protagonizado por Adonis Johnson (Michael B. Jordan), o filho de Apollo Creed. Ele procura Rocky para treiná-lo e se tornar um boxeador como seu pai. Dirigido pelo promissor Ryan Coogler, Creed é quase um reboot de Rocky: Um Lutador. É um longa que conquistou um público novo e também conseguiu agradar os fãs antigos da franquia Rocky. O lançamento iminente de Creed II eleva as expectativas após a notícia que Adonis lutará contra Viktor Drago, o filho de Ivan Drago, o oponente que matou Apollo em Rocky IV.
PUNHOS DE SANGUE (2016)
A luta que inspirou Sylvester Stallone a escrever o roteiro de Rocky: Um Lutador ganhou filme. Em 1975 Stallone assistiu ao vivo a luta entre Muhammad Ali e Chuck Wepner. Ao final, o roteirista ficou fascinado com o resultado: Wepner, um desconhecido, aguentou quase até o fim da luta contra o campeão e, inclusive, conseguiu derrubar Ali durante o nono round. O filme é estrelado por Liev Schreiber, Naomi Watt, Ron Pelrman e Elizabeth Moss, e dirigido por Phillipe Falardeau.