Visão do Fã | De Volta para O Futuro
Era uma sexta-feira, dia 20 julho. Fui comemorar meu aniversário num lugarzinho especial, o The Clock (na rua Turiassú, 806, Perdizes, São Paulo-SP), onde tive a oportunidade de sentir como se eu estivesse num baile dos anos 50. Logo na entrada havia uma placa: “Bem Vindo a 1954”. Desde o chão, até as mesas, as roupas, o bar, a música, tudo era como se eu tivesse viajado numa máquina do tempo direto para aquele ano. Que lugar mágico!
Na manhã seguinte, quando acordo, curto aquela preguicinha que tenho direito e depois me levanto para tomar café. Tomo meu banho em seguida pra tirar aquele suor da noite anterior. Assim que me troco e chamo o Uber, vou passear na Avenida Paulista com meus primos. De lá seguimos para a rua Pamplona, onde fomos para a loja Toyshow! Chegando lá, me deparo com nada mais nada menos que um DeLorean em tamanho real junto com Marty McFly!
Assim que saí de lá, fiquei pensando a respeito de tudo que aconteceu. Era muita coincidência! Não era possível. Era um sinal me dizendo para rever a trilogia De Volta para o Futuro, que já fazia muitos anos que eu não via. Foi então que surgiu a ideia de escrever o Visão do Fã daquela que talvez seja a melhor trilogia do cinema!
De Volta para o Futuro (1985)
Digno do termo clássico do cinema, De Volta para o Futuro conta a história de Marty McFly (Michael J. Fox), um jovem do ensino médio, que viaja acidentalmente para o ano de 1955 por meio de uma máquina do tempo, um DeLorean super estiloso inventada por seu amigo, o doutor Emmett Brown (Christopher Lloyd). Agora Marty deve arranjar uma maneira de retornar ao seu presente, o ano de 1985. Enquanto isso, Marty se envolve numa trama com seus pais adolescentes. Sua mãe, Lorraine (Lea Thompson), se apaixona pelo seu filho do futuro, ao invés de seu pai, George (Crispin Glover). Por isso, McFly deve bolar um plano para ambos dançarem juntos na festa do colegial, que ocorrerá em 7 dias! O problema para tal se divide em dois: o vilão Biff (Thomas F. Wilson), apaixonado por Lorraine, porém um valentão incrivelmente burro e bruto, e a terrível insegurança de George, incapaz de chamar Lorraine para ir ao baile.
A razão pela qual esse filme é um grande sucesso está no roteiro de Bob Gale e Robert Zemeckis. Até hoje esse longa é utilizado como exemplo de um roteiro perfeitinho, praticamente ausente de erros. Em quase um quarto do filme, são apresentados todos os elementos que serão necessários para o que vier adiante. Uma tomada de decisão ambiciosa, diga-se de passagem, pois é uma tarefa árdua. Bem árdua! Mesmo assim, a obra lapida personagem a personagem, até mesmo os secundários. Temos Marty, o Dr. Brown, George McFly, Lorraine Baines e até o vilão Biff. E não há nenhum detalhe que foi jogado e esquecido. O Sr. Strickland (James Tolkan), o candidato a prefeito Goldie Wilson (Donald Fullilove), etc. Todos tem uma razão para sua rápida introdução no primeiro ato do longa. É como se a própria cidade de Hill Valley se comportasse como um organismo vivo e a cooperação de todos fosse essencial, principalmente nossos protagonistas Marty e Doc. Por isso que De Volta para o Futuro precisa ser visto com bastante atenção para não deixar passar nada despercebido.
Ademais, a construção da tensão e todo o desenvolvimento são fabulosos. O uso do fator da coincidência é muito bem trabalhado, e certamente um dos melhores do cinema de todos os tempos. O fato do baile que George e Lorraine dançam coincidir justamente com a data que Marty retorna ao seu tempo é crível com relação a história. Uma vez que na primeira parte do enredo esses elementos já tinham sido nos dado de bandeja num diálogo esclarecedor entre Marty, George e Lorraine. Naturalmente, você acaba tão imerso na história que imperceptivelmente estará torcendo pelo plano de Marty e do Dr. Brown ser um sucesso. Fruto da sublime direção de Robert Zemeckis, a produção de Steven Spielberg e o acesso financeiro aos recursos da Industrial Light Magic, que sustentou o melhor que os efeitos visuais podiam oferecer na época.
Também temos um elenco excelente, claramente escolhido a dedo. A interpretação varia do drama a comédia, acertando um tom ideal para uma história de aventura. Os figurinos revivem os anos de ouro para os americanos. O american way of life, o auge de Hollywood, as grandes estrelas, a consolidação dos grandes estúdios e das grandes emissoras de TV e rádio que perduram até hoje, uma época em que as pessoas vislumbravam o futuro com muito otimismo e a perseverança que tudo sempre melhoraria.
A comédia é outro ponto essencial. Ela se responsabiliza por tornar o filme tão leve, apreciativo e gostoso de acompanhar. As sequências são brilhantes, bem como as brincadeiras com as diferentes décadas. Cenas hilárias, como quando Marty conhece Goldie Wilson e fala que ele poderia ser prefeito. Ou então quando Doc pergunta quem é o presidente em 1985, e Marty responde “Ronald Reagan”, Doc ri e pergunta em tom de ironia: “O ator?!”.
Os arquétipos do filme constituem um excelente objeto de análise dos anos 80. Marty McFly é o tipo perfeito de “herói” da época. Uma década marcada por valorizar intensamente a juventude. A rebeldia é a essência que move o jovem, além da paixão e a oposição com os modelos rígidos e tradicionais do ensino. Inúmeros filmes foram realizados com essa temática: Curtindo a Vida Adoidado (1986), O Clube dos Cinco (1985) e toda a filmografia do diretor John Hughes forma um belo conjunto de bons exemplos. Variações de gênero não fogem muito do padrão, como o terror A Hora do Espanto (1985) ou o belíssimo drama Sociedade dos Poetas Mortos (1989). Contudo, De Volta para o Futuro é o melhor. Marty McFly consegue agregar todos esses valores, o sujeito de 17 ou 18 anos, intrépido, impetuoso, rebelde, guitarrista, anda de skate, tem uma namorada bonita, e, sobretudo, o personagem consegue agradar todos os públicos.
Para complementar, a memorável trilha sonora de Alan Silvestri é nostálgica e põe um sorriso no rosto de qualquer um. As canções originais para o longa, “The Power of Love” e “Back In Time”, compostas pelo grupo Huey Lewis & The News, são marcantes e novamente relembram da valorização dada a juventude dessa década.
Porém, a cena mais conhecida do filme é Marty McFly tocando “Johnny B. Goode”, de Chuck Berry. Uma música de tirar os pés do chão, e amada eternamente pelos fãs.
Um sucesso de bilheteria (a maior de 1985) e de crítica, De Volta para o Futuro é um conjunto de superlativos, que une uma excelente equipe técnica a um projeto caro, ambicioso e, sobretudo, empolgante. Provavelmente o melhor filme da década de 1980.
NOTA: 5/5
De Volta para o Futuro 2 (1989)
A sequência de um grande sucesso é sempre mais difícil. Contudo, De Volta para o Futuro 2 consegue encontrar um meio termo para não ser nem uma história exatamente igual ao primeiro e cair no esquecimento, nem um enredo excessivamente inovador e diferente, o que poderia causar estranhamento e parecer desrespeitoso à obra original.
Se no primeiro viajamos 30 anos para o passado, que tal agora ir 30 anos para o futuro? De Volta para o Futuro 2 vai para o ano de 2015 e posso dizer que se nosso presente fosse do jeito que é no longa seria muito mais legal do que realmente é. Pizzas desidratadas, tênis que amarram sozinhos, roupas cujo tamanho se ajusta ao corpo, skates flutuantes, carros que voam e movidos a combustível de energia renovável (no caso, era lixo mesmo, que é sensacional).
Na trama, Marty deve ir com o Dr. Brown para a cidade de Hill Valley de 2015 para salvar a vida de seus filhos do futuro, que estão prestes a ser presos após tomarem decisões erradas.
De início, tudo o que deu certo no primeiro filme ressurge neste. Agora o vilão é Griff, neto de Biff, Marty envolve-se novamente numa complicação familiar embaraçosa, bem como a sequência de Marty fugindo de skate é repetida, só que no futuro. No entanto, o que não se esperava é que isso tudo se limita a apenas um terço do filme.
Novas aventuras no tempo ainda mais complexas se desdobram em realidades alternativas e num surpreendente desfecho que retorna a 1955! Marty tem que fugir de um Biff magnata e depois resolver os problemas retornando aos eventos do primeiro filme. Assim, ele deve enfrentar novamente o Biff jovem e evitar o Marty do passado, o que poderia criar um paradoxo que daria origem a uma catástrofe mundial!
O elenco é mais uma vez brilhante. Michael J. Fox interpreta diversos personagens simultaneamente: Marty McFly do presente e o Marty derrotado do futuro, e seus dois filhos também, o boboca Marty Jr. e sua filha, Marlene. Todos são diferentes entre si e revelam a excelente qualidade do ator. O mesmo acontece com Thomas F. Wilson, que atua como o jovem Biff bobão do passado, o Biff velho, o Biff milionário do presente alternativo e o seu neto biônico Griff.
É curioso também notar que da mesma forma que 1955 via o futuro com grande otimismo, o mesmo acontece com 1989, que retratou 2015 como uma era que teríamos superado diversos problemas vividos no século XX, como o dos alimentos perecíveis (vale lembrar da pizza desidratada) e, principalmente, os combustíveis poluentes e não renováveis, como a gasolina, o diesel e o gás natural.
De Volta para o Futuro 2 é ainda mais engraçado e traz uma trama mais embaraçosa. A continuação, apesar de mais confusa e corrida, consegue manter o nível e ser tão bom quanto o original.
NOTA: 5/5
De Volta para o Futuro 3 (1990)
Filmado junto com o segundo, De Volta para o Futuro 3 resgata a era de ouro dos faroestes em Hollywood e nos entrega uma linda homenagem ao gênero que por três décadas arrecadou mais dinheiro que todos os outros.
Ao final do segundo filme, Doc vai parar acidentalmente no ano de 1885, na Hill Valley do Velho Oeste, enquanto Marty fica preso em 1955. Marty recebe uma carta de Doc, entregando-lhe o DeLorean e pedindo que consertasse e voltasse a 1985, pois se encontrava muito feliz no Velho Oeste. Todavia, quando descobre que o Dr. Brown morreu sete dias depois que escreveu aquela carta, Marty decide salvar a vida de seu amigo.
São notáveis aqui os principais elementos que compunham um faroeste: as cidades pacatas, os figurinos (o de Marty homenageia o astro Clint Eastwood), os tiroteios nas tavernas, as brigas ao amanhecer do dia, o conflito entre os índios e os homens brancos, os planos mais abertos normalmente enquadrando os atores dos joelhos para cima (plano americano) com o propósito de deixar à mostra o coldre dos pistoleiros.
O ritmo desta terceira parte não é mais tão fluído quanto os anteriores. Temos uma história um pouco mais lenta e preocupada com os protagonistas. Doc deixa de ser apenas aquele cientista meio biruta quando se apaixona por Clara (Mary Steenburgen), uma professora de Ciências. Ele enfrenta o dilema de abandona-la e retornar ao seu tempo ou ficar e se casar com ela. Enquanto Marty deve confrontar seu trauma de ser chamado de covarde, que vem lhe colocando em muitas confusões.
Um filme mais moralista, com a mensagem de que são nossas atitudes que definem nossa história, De Volta para o Futuro 3 fecha a que talvez seja a melhor trilogia de todos os tempos. Todos os filmes mantém um ritmo razoavelmente semelhante e num mesmo nível de qualidade. Não tem como não maratonar essa trilogia, pois, além de rápida, cada filme chama o próximo, então é imperdível.
NOTA: 5/5
OUTRAS INDICAÇÕES
Back In Time (2015)
O documentário feito sobre os trinta anos do clássico mostra os bastidores do filme desde onde surgiu a ideia de fazer o longa até os problemas enfrentados durante. Podemos conferir depoimentos dos atores, roteiristas, produtores e até o diretor Robert Zemeckis. Vale a pena para quem é muito fã da trilogia!
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